Além da guerra na Ucrânia, traições acirram crise no bolsonarismo.
Se as pesquisas desta semana trouxeram algum alento ao entorno do presidente Jair Bolsonaro demonstrando algum esboço de recuperação, há outros fatores fora delas que apontam para problemas que a turma que tenta reeleger o capitão terá que resolver. Ficaram explicitadas algumas divergências que, se não forem resolvidas, podem acabar esfacelando a base montada em torno da reeleição do presidente.
A primeira clara divergência é quanto à guerra entre a Rússia e a Ucrânia. O vice-presidente Hamilton Mourão não deu o duro recado que deu na quinta-feira (25) sobre à Rússia à toa. Mourão é um claro representante do pensamento do generalato brasileiro. Ele faz parte da cúpula militar, segmento do qual Bolsonaro, capitão reformado, não faz parte.
O confuso alinhamento de Bolsonaro a Putin contraria o alinhamento militar brasileiro de forma histórica. Desde, pelo menos, a Segunda Guerra Mundial, quando os nossos pracinhas aliaram-se aos aliados na Itália para combater o Eixo. Ficou Bolsonaro de certa forma associado, ainda que involuntariamente, a um discurso de extrema-esquerda, que autoriza Putin a invadir a Ucrânia como reação à tentativa “imperialista” de abrir um enclave da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) ali e por ali ameaçar a Rússia no Leste Europeu. É o discurso de Nicolás Maduro, presidente da Venezuela, e é muito estranho imaginar Bolsonaro pensando o mesmo que Maduro.
Mourão fez o seu pronunciamento sobre a Rússia usando uma máscara com a bandeira do Rio Grande do Sul, estado pelo qual deverá sair candidato ao Senado pelo Rio Grande do Sul. Ou seja, foi uma peça de campanha. E uma peça de campanha que demarca uma diferença do vice com relação ao presidente.
E Mourão será candidato ao Senado pelo Republicanos. Partido que, esta semana, fez ensaios de desembarque. O presidente do Republicanos, Marcos Pereira, reclamou que Bolsonaro atrapalha o crescimento do partido, ao estimular somente o crescimento do PL, ao qual se filiou.
Há ainda um outro ponto de divergência que merece ser observado. Os grupos mais ligados à pauta de costumes no Congresso ficaram extremamente incomodados com a aprovação esta semana do projeto que legaliza os jogos de apostas. Para esses grupos, especialmente a Frente Parlamentar Evangélica, a aprovação mostra um total descompromisso do Centrão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com a pauta de costumes, que eles tanto prezam. O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), disse que Bolsonaro irá vetar o projeto se ele for aprovado. Mas o que se comenta no Congresso é que isso seria mero jogo de cena. Bolsonaro veta, para ficar bem com a base conservadora, sabendo que a maioria que aprovou agora o projeto se formará depois para derrubar o seu veto.
AUTORIA
RUDOLFO LAGO Diretor do Congresso em Foco Análise. Formado pela UnB, passou pelas principais redações do país. Responsável por furos como o dos anões do orçamento e o que levou à cassação de Luiz Estevão. Ganhador do Prêmio Esso.
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