ENTENDA A REVIRAVOLTA NO CASO “PAMONHEIRO”

Promotoria pediu anulação do primeiro júri e advogados de “Baiano” conseguiram agora inocentar completamente o cliente. Os jurados entenderam que “Baiano” não foi o autor da prática do crime de homicídio ocorrido em janeiro de 2015, porque as provas dos autos não eram suficientes para tamanha condenação.

Advogados Marcelo Gomes Pereira e Gustavo Botteon
Advogados Marcelo Gomes Pereira e Gustavo Botteon

Agora é definitivo e não cabe mais recurso. Após um período de pouco mais de 4 anos, os advogados tupãenses Luis Gustavo Guimarães Botteon e Marcelo da Silva Gomes Pereira, na última segunda-feira, dia 04 de fevereiro, conseguiram, o que parecia, aos olhos de quem não é especialista em Direito Criminal, praticamente impossível. Com uma brilhante atuação jurídica baseada inicialmente na negativa de autoria, os advogados obtiveram êxito pleno no segundo júri popular e conseguiram inocentar complemente da acusação de homicídio o agricultor e feirante Francismar Luiz de França, o “Baiano”, que estava sendo acusado pela Justiça Pública local, através do Promotor Marcelo Brandão Fontana, pela prática do crime de homicídio qualificado, fato ocorrido em 13 de janeiro de 2015, contra o comerciante e, também feirante, Cláudio Rafael Zaurísio, o “Claudio Pamonheiro”.

A sessão do Tribunal do Júri foi instalada por volta das 9 horas da manhã e teve fim às 19h30, oportunidade em que foi proclamada a sentença pelo Juiz Fábio José Vasconcellos, que presidiu a sessão do Júri, absolvendo por completo o acusado da autoria pela prática do crime de homicídio qualificado. A Promotoria buscava com este segundo júri convencer os jurados a decidirem de maneira diversa, ou seja, buscava que lhe fosse aplicada a pena por homicídio qualificado por asfixia, que resultaria numa pena mínima de 12 anos de detenção com regime inicial fechado, em substituição da pena anterior de um ano de reclusão, onde Francismar foi condenado por homicídio culposo pelo conselho de sentença, por ser primário. “Baiano” já havia ficado preso por 6 meses em razão deste caso preventivamente, por prisão cautelar. O acusado saiu livre daquele júri na companhia dos seus advogados e com o dever de cumprir o resto da pena em liberdade, mas com restrição de direitos, as quais foram plenamente cumpridas pelo acusado.

No entanto, a estratégia da Promotoria de tentar um novo julgamento e, por consequência, tentar convencer o novo corpo de jurados a decidir por uma punição ainda maior ao acusado, acabou não logrando êxito, vez que os novos jurados entenderam, desta feita, por inocentar o “Baiano” completamente das acusações, o que fez com que o juiz Fábio José Vasconcellos proferisse uma sentença absolvendo-o da prática do delito homicídio com fundamento legal no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal, o qual diz o seguinte: “O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal”.

O corpo de "Cláudio Pamonheiro" foi localizado carbonizado no interior da camionete
O corpo de “Cláudio Pamonheiro” foi localizado carbonizado no interior da camionete

Antes deste novo julgamento, os novos jurados, a acusação e a defesa estavam cientes de que poderia haver, em razão da primariedade e dos bons antecedentes do acusado, apenas quatro resultados, a saber:

•         absolvição do acusado pela negativa de autoria (artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal);

•         manutenção da pena já imposta ao réu no primeiro julgamento de 01 (um) ano de reclusão por homicídio culposo (artigo 121, § 3º, do Código Penal);

•         punição de 6 anos de reclusão por homicídio simples (artigo 121, do Código Penal); e, por fim,

•         punição de 12 anos de reclusão (artigo 121, § 2º, III – Homicídio qualificado – caso em que o homicídio é praticado com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum).

Desde o começo do júri popular, o Promotor que atuou no caso, Marcelo Brandão Fontana, baseou-se na tese do homicídio qualificado, tentando transpassar aos jurados sua convicção de que Cláudio “Pamonheiro” teria sido morto por “Baiano” através da asfixia, possivelmente ocorrido por uma corda.

Entretanto, a defesa se fundamentou na negativa de autoria, vez que a causa da morte da vítima e os mecanismos do evento morte, após dois laudos periciais técnicos e específicos, não conseguiu ser legalmente definida, obtendo da médica legista Adriana de Araújo Falcão, como “causa morte indeterminada”.

Baseando fundamentalmente suas argumentações nas consequências que este laudo pericial tecnicamente inconclusivo poderia causar ao julgamento da presente lide, os advogados aliaram sua defesa ainda na tese do conhecido e popular Princípio do “in dubio pro reo”, elencado no artigo 386 do Código de Processo Penal, no qual o réu poderá sim ser absolvido, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008).

Ao todo, foram elaborados para este novo júri um total de 5 quesitos (todos em anexo), aos quais destacamos que, no primeiro deles, houve o seguinte resultado: 7 a 0 para a resposta “SIM”. Este quesito foi formulado com a seguinte indagação: “no dia 13 de janeiro de 2015, no final da tarde, mas em horário indeterminado, numa área rural (roça de milho), localizada atrás do “Motel Talismã”, na estrada vicinal que liga Tupã a Arco-Íris, nesta Comarca de Tupã/SP, o ofendido Cláudio Rafael Zaurisio foi lesionado durante contenda, inclusive com uma barra de ferro, conforme laudos periciais de fls. 70/73 e 277? Portanto, ficou bem claro na visão de todos os sete jurados que ocorreram as lesões no corpo do falecido, ferimentos estes advindos de uma contenda (briga) entre vítima e acusado.

No entanto, na apreciação do quesito posterior, ou seja, o de número 2, os jurados, por maioria de votos, obtiveram a convicção da negativa de autoria, pois o voto “NÃO” foi a maioria da vontade dos jurados na apreciação da seguinte pergunta: “o réu FRANCISMAR LUIZ DE FRANÇA, vulgo “Baiano”, praticou o crime, desferindo golpes, inclusive com uma barra de ferro, causa eficiente da morte da vítima?”

Portanto, a maioria dos jurados ao votar “NÃO” neste quesito, entendeu que, conforme grifo nosso acima, o “Baiano” simplesmente não cometeu o crime de homicídio, ocorrendo, em decorrência, o que, no mundo jurídico, se denomina como “NEGATIVADE AUTORIA”, o que acabou por decretar como “prejudicados” todos os demais quesitos que ainda necessitariam ser avaliados.

RECONSTRUÇÃO DA VIDA FINANCEIRA E FAMILIAR

"Baiano", logo após ser preso
“Baiano”, logo após ser preso

No final do julgamento da última segunda-feira, uma indagação ficava na mente das pessoas que assistiram o julgamento: se o réu é inocentado completamente da autoria de um crime de homicídio, como fica aquele período de 6 meses que ele ficou preso? Seria este período de prisão uma punição injusta ao acusado, que agora conseguiu sua liberdade? Caberia a ele uma indenização civil do Estado?

Diante destas dúvidas, necessário explicar que a prisão, em nosso ordenamento jurídico, é aplicada de duas formas distintas: a prisão-pena e a prisão sem pena. A prisão-pena é oriunda de uma decisão transitada em julgado, o que não será aplicado ao presente caso, vez que o acusado foi absolvido e não mais caberá recurso por parte da Promotoria.

Já as prisões sem pena são utilizadas como “medidas cautelares” para garantir que o processo crime seja eficaz quanto ao seu fim, para preservar a ordem pública, a ordem econômica e para conveniência da instrução criminal. Foi neste contexto de situação que o acusado acabou sendo obrigado a ficar em torno de 6 meses preso em regime de reclusão, mesmo agora tendo provado para toda a sociedade que é completamente inocente da acusação que lhe foi imputada pelo Ministério Público.

Quando da sentença do primeiro julgamento, o Dr. Fábio Vasconcelos não estabeleceu uma pena privativa de liberdade em dias, uma vez que a decisão do tribunal do júri, naquela ocasião, poderia ser passível de recursos por ambas as partes, uma vez que a tipificação do crime foi alterada de homicídio doloso para homicídio culposo e por legítima defesa. O réu, na época desta primeira sentença, já havia cumprido pouco mais de seis meses de prisão, pois foi preso preventivamente em 14 de janeiro 2015 e posto em liberdade condicional em 28 de julho de 2015.

Em razão disso tudo, o objetivo agora dos advogados é continuar o que eles denominaram como “reconstrução da vida financeira e familiar do feirante”, reconhecidos em nossa comunidade pelo fato de serem trabalhadores, humildes e honestos.

Só para se ter ideia, quando dos acontecimentos dos fatos, em janeiro de 2015, o acusado possuía um total de cinco fontes de renda para sustentar a sua família: era feirante e recolhia ISSQN para as Prefeituras de Tupã, Queiroz e Rinópolis, locais onde, com a esposa e os dois filhos, faziam semanalmente o comercio de melancia, abobora e milho, além de ser arrendatário de terras onde plantava os milhos e, por fim, estava empregado com registro em carteira como funcionário rural (operador de máquinas) na Usina Clealco, em Queiroz-SP.

“Mas infelizmente, atualmente, ele apenas possui uma recente fonte de renda. Ela é decorrente de trabalho, também registrado em carteira, numa propriedade rural localizada perto de Tupã, emprego este que demorou certo tempo para ele obter novamente. Houve, portanto, uma significativa diminuição de renda da família, a qual também necessita ser reconstruída no seu aspecto emocional e psicológico, vez que agora a sentença absolvendo o acusado da autoria da prática deste crime, fará agora com que ele ande de cabeça erguida em qualquer local de nossa comunidade”, comentou um de seus advogados.

A defesa do “Baiano” asseverou ainda que, nestes últimos quatro anos, o feirante foi obrigado, em razão deste acontecimento, a conviver longe dos seus dois filhos, os quais, entristecidos com tudo o que ocorreu com a família, se mudaram para uma cidade no Estado do Paraná, permanecendo com ele apenas a esposa, a qual permaneceu ao lado do Francismar nestes momentos de dificuldades”, finalizaram os advogados.

No início da defesa deste processo, a dupla de advogados conseguiu, ainda em janeiro de 2015 e com a participação do delegado Washington Muzzi, provar para a Justiça que o filho do Francismar não teve participação alguma na morte do Sr. Cláudio, colocando-o em liberdade e retirando formalmente também a acusação de homicídio contra o então filho do acusado, Igor Luiz de França, que naquela ocasião tinha apenas 19 anos.

“Agora conseguimos absolver também o pai. Foi um trabalho árduo, difícil e que resulta na chamada inocência plena do nosso outro cliente”, comemoraram os advogados. No transcorrer de todo o andamento processual, os advogados conseguiram lograr êxito em comprovar, de forma farta e com declarações e depoimentos de muitas testemunhas que conheciam a vida pregressa e a conduta ética e moral dos acusados, que pai e filho são pessoas humildes, com empregos fixos, registro em carteira e não possuíam antecedentes criminais. Também arrendavam terras e plantavam roça, cultivavam os produtos e os vendiam nas feiras livres de Tupã, Queiroz e Rinópolis.

Os advogados finalizaram argumentando que agora estão concedendo aos familiares e ao próprio acusado todas as orientações jurídicas e emocionais no sentido de ressaltar a importância novamente do retorno da vida familiar em comum, vez que a intenção primordial de todos agora é a reconstrução da união do núcleo familiar da “Família França”, que acabou sendo muito abalado com todos estes tristes acontecimentos, com a devida, imprescindível e necessária reintegração de todos eles não só em sociedade como no próprio mercado de trabalho, vez que essa sempre foi a grande marca valorosa dessa conhecida família de feirantes de nossa cidade.

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